segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Todo excesso é sintomático

Todo excesso, sem exceção, é sintomático.
Bem vindo a cultura dos excessos!
Parece que tudo é demasiado.
O sujeito busca tanto emendar a falta que torna-se excessivo, obsessivo.
Obsessivo pelo excesso porque busca o que nem sabe.
Não reconhece seu desejo, parece estranho a ele mesmo.
O excesso do consumo...
Da bebida, da comida e já que neste âmbito, do sexo...
Tudo é (de)mais...
E nesses momentos de excesso, forja-se uma felicidade que também excede.
E repete, repete, repete...
Sempre aquela mesma história
Compulsão a repetição, Freud já alertava.
Mas, quando de volta ao não excedido da sua real existência, a calmaria e o silêncio, o espelho defronte de si mesmo, sem aquele barulho do excesso: encontro insuportável.
Então, repete, repete e repete...
Roseane Farias

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Alem do sintoma


Adoeceu! De repente, um sintoma irrompe e fragiliza o corpo.

Nada demais, simplesmente aconteceu...

A cabeça doe, o corpo reclama, parece que algo se esgotou, se entregou e deu trégua.

A trégua do barulho de mim mesmo, aquele que sustenta a minha mentira, minha falsidade ideológica.

Minha imagem como um documento sem rasuras e nem borrões. O que se vê parece verdadeiro. Todavia, nesse caso, aquilo que está dentro do documento é o que denuncia sua (não)originalidade.

Porque falsa é a idéia que ele contém.

O sintoma denota essa falha! Irrompe devastando a integridade do corpo.

O mundo fantasiado, falseado, a máscara da existência claudicou e caiu.

O conflito dos dois mundos.

Conflito do desejo.

Entre aquilo que se deseja e o que não se pode desejar.

O desejo que se realiza parece que é pequeno perto daquele que é irealizado.

E assim, o corpo sinaliza para avisar que algo não está mais dando certo, não está mais funcionando.

O corpo termina estampando, fazendo a denúncia do desejo.

Se expressando como um hieróglifo a ser decifrado a partir do sintoma.

E nesse percurso, de desejo em desejo, não se surpreenda, haverá sempre um sintoma.
Roseane Farias



quinta-feira, 19 de agosto de 2010

O avesso da lei

A lei que não se cumpre...

E o direito `as avessas.

De um lado a submissão forçada, a fragilidade forjada.

De outro, o poder e o direito confusos no emaranhado da ilusória força masculina.

Homens contra mulheres.

E por efeito do feminismo, hoje: Mulheres contra homens.

Da luta pela igualdade, elas esqueceram que a princípio era a favor de si mesmas e não contra eles.

Entrementes, séculos de androcentrismo impregnaram o imaginário social.

Disso o século XXI não se livrou, apenas tentou varrer para debaixo do tapete.

Maria da Penha tentou, insistiu e não apenas saiu, como rasgou o tapete.

Todavia, suportar essa fenda é se deparar com a castração.

Belos histéricos nós temos!

Parece difícil punir o agressor.

Árdua tarefa aceitar que não há propriedade.

Que mulher não pertence e nem é direito.

E aqueles que aplicam a lei, divididos, confusos. Ainda não sabem de que lado ficar.

Recordando Badinter (2005), questiono também de que lado nós mulheres estamos?

O "vitimismo" também traz gozo.

Roseane Farias

quarta-feira, 7 de julho de 2010

O blefe da euforia

As vezes o entusiasmo até convence.
As megalomaníacas conquistas, os alardes sobre as aventuras amorosas, aliás, sexuais.
As mil e uma noites, os mil e um encontros.
Incansável, predador, pega-dor...
Se tem o que quer parece satisfeito, mas por que a busca é interminável?
Desejo... que desejo é esse? é repetitivo, por isso obsessivo.
A lógica é justamente a oposta, aqui quantidade é sinônimo de barulho.
Inquiet(ação), uma ação que radiografa uma insatisfação.
Um barulho velado pelo sorriso sarcástico, sarcástico o suficiente para tamponar bem a falta.
E se eu te perguntar o que falta, responderá de súbito: nada!
Decerto, pensará depois. Há sempre esse instante inevitável.
Todavia, quantos minutos se ganhará com a interrogação?
Presumo que deparar-se consigo mesmo nem sempre é tentador, o espelho é ameaçador.

Roseane Farias

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Minha amiga Patch Adams


Era um dia comum e alguém lembrou-se de fazer bem.
No mundo dos encapuzados e esquecidos, alguém afetou alguém.
No desejo de fazer alguém sorrir, (re)ativou-se em alguém o desejo de viver.
Quantos pequenos gestos mudam o viver...
Era uma tarde como outra qualquer e a enfermeira lembrou-se que assistir é amar.
Convidando seu paciente a andar, retira-o do leito e o faz recordar que há algo fora daquele lugar.
Vendo os dois a caminhar, percebo não haver, naquele instante, nada mais importante do que apreciar a simplicidade da vida nas árvores da rua, num carrinho de caldo de cana, nas pessoas a falar.
Então, fico a pensar...
Parece ser tudo demasiado, como diz Meireles! O cenário dos espetáculos, o mundo do fantástico e dos inventos.
E enquanto isso, tantas vidas que desejam apenas, respirar, andar, falar, sorrir, viver.
Quantos pequenos desejos abafados. Quantas razoes justificadas na correria da vida frenética.
O tempo passando, a vida se exaurindo das nossas mãos, alguém pedindo atenção.
E na estacao onde o trem vai passando, coisas ficam para trás, pessoas-sem se olharem- se despedem no caos.
Mas, e a enfermeira? Espero encontra-la la, no mesmo lugar.
(Dedicado a minha amiga e Enfermeira: Daniglayse)

Roseane Farias

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Cultura de excessos

Perversa, excessiva, líquida, nossa cultura responde ao excessivo, é perversa.
Tudo se esvai, é líquida.
Há uma relação peculiar do sujeito com a cultura, tudo enfeixado.
São os nós que constituem o que chamamos de civilização.
E nessa linha nue entre sujeito e cultura, as manifestações clínicas estampadas no cenário comtemporâneo são expressões do mal-estar que marca a atualidade.
O mal-estar da anorexia, das fobias,da bulimia, da síndrome do pânico. O mal-estar da cultura.
Assistimos apáticos ao funcionamento social, aquele que tece os sintomas vividos.
O sujeito despersonalizado. Sem identidade, inconformado.
Nesse palco atroz, a subjetividade discursiva cede lugar a subjetividade da imagem. Alguém já ouviu dizer: "imagem é tudo"
E no campo das imagens produzem-se as psicopatologias, as quais tornam-se peças comuns, fazem parte...
Para fugir do indizível, do não falado- porque palavras não falam mais- o sujeito vomita, perde o apetite de falar, se aprisiona num silêncio silenciado, entra em pânico, o pânico da fobia de viver.

Roseane Farias

sexta-feira, 7 de maio de 2010

As vezes, o verbo é para incomunicar

Incomunicar, as vezes, jaz a intenção do Verbo.
Se não para comunicar, confundir com certeza.
E nas entrelinhas das palavras ditas, uma verdade não falada, uma voz que não se escuta.
Ao pensar saber tudo porque se ouviu, "a verdade" se diverte no empobrecer da linguagem tão limitada quando se trata de desejos, de dor, de sentimentos...
Subjacente ao Verbo, as coisas caladas se denunciam num olhar, num gesto, no embravecer de uma afirmação, no comunicar de uma fala racional, elaborada, tão impregnada de razoes justificadas que acordam com o sujeito um tratado de paz.
Por um instante se pensa estar seguro e guardado, tudo em paz...
Todavia, o caos das "verdades" prensadas num discurso "arrumado" fazem suas fendas, abrem sempre, de alguma forma, seus furos, as vezes, na própria linguagem e nessa linha tenue a verdade velada vai aos poucos mostrando sua cara, se não por palavras, por ato.

Roseane Farias

domingo, 28 de março de 2010

(Re) Inventando a vida


Às vezes calar é uma saída. Escrever também.

Entretanto, se falar estampa o desejo, escrever o grafa nas entrelinhas.

Desejo não esmagar as entrelinhas com palavras, já pedia Clarice.

Mas há um desejo, aquele que quer falar, aquele que pede escuta.

Se a dor pede caminho, viver pede invenção.

(Re) inventar marca o desejo porque viver e morrer estão no calendário.

O tempo que é marcado por vidas e por mortes todos os dias, todo o instante.

O tempo que não pára que não permite sinal vermelho, está sempre no verde.

Sendo assim, viver é mera invenção.

(Re)Inventar aquilo que foi perdido; a falta; quem não se tem mais; a tristeza e a dor de cada dia.

(Re) Inventar para ser. Ser o que se deseja.

(Re) Inventar para sair do caos.

(Re) Inventar para Viver.
Roseane Farias